As hastes do veado vaidoso
Era uma vez um veado que tinha em grande apreço as suas hastes recortadas, que lhe davam à cabeça um ar de majestade.
Quando ia dessedentar-se no lago, tanto bebia como se mirava.
— Que gloriosos chifres os meus! Nenhum animal de cornos os tem tão formosos.
Em contrapartida, as patas delgadinhas desgostavam-no. Debruçado para a água, comparava-as com a volumosa e artística cornadura, e dizia:
— As minhas pernas estão desproporcionadas com os extremos do meu corpo. Não fossem elas assim tão estreitas e eu seria o mais elegante dos animais.
Nisto, o veado ouviu, não longe, o uivo de trompas de caça. Ele sabia o que aquela música significava. Fugiu.
Caçadores a cavalo perseguiram-no. Corriam os cavalos a galope e corria o veado, com quantas pernas tinha.
Ágeis, as pernas, no arremesso do medo, saltavam barrancos, venciam precipícios, quase voavam. O veado só pedia que o vigor das pernas não o abandonasse.
Mas, num túnel de ramos, os galhos do veado embaraçaram-se nos troncos e suspenderam--lhe a corrida. Já se aproximavam os cavaleiros. Os belos chifres estavam a deitá-lo a perder.
Sentindo-se perdido, o veado deu um sacão ao corpo e metade de um chifre, que estava preso, partiu-se. Deixá-lo. O veado livrou-se.
As pernas retomaram a fogosa carreira da salvação e o veado conseguiu escapar dos caçadores.
Já livre de perigo, o veado pôs-se a pensar no que lhe sucedera. As pernas, que ele há pouco desprezava, tinham-no salvo. As hastes da sua vaidade por pouco que não o atraiçoavam.
António Torrado
www.historiadodia.pt
O Clube de Contadores de Histórias
Biblioteca da Escola Secundária Daniel Faria - Baltar
Sem comentários:
Enviar um comentário