18 novembro 2008

Lendo… aos poucos (IV)

“Nada o fazia deter. Não via a hora de chegar ao destino para saber com o que podia contar. Consigo levava uma vontade indomável que não o deixava vacilar, sabia que alguma coisa se havia de arranjar. “Hei-de vencer. Nem que para isso tenha de me arrastar…” Nem a despedida emocionada lhe desviara a ideia do objectivo principal, nem o abraço da sua mãe lhe fez quebrar o ânimo, nem o olhar ternurento dos irmãos o fez vacilar, ainda que o prendessem mais à sua família simples e boa. No seu lar, onde aprendera a andar e no seu quarto onde tantos sonhos se levantaram, ficariam as memórias da sua infância repletas de luz, mas o futuro que ainda não tinha sido erguido, fazia-o correr mais, no caminho que iria calcorrear com toda a sua energia. A vida é feita de partidas e chegadas, de entregas e abandonos, de encontros e desencontros, todos feitos com lágrimas de partida mas também de alegria duma chegada que um dia vai surgir. Um dia haveria de voltar homem feito, pessoa de bem com alma serena, de bem com a sua consciência! Tinha feito tudo para que desse certo. A terra que lhe servira de berço, não lhe podia dar pão, nem horizontes de esperança onde pudesse saciar a sede de conhecimento. O desejo de progredir como ser humano, era infinito, sendo assim teria de ir à luta. Trabalhar para se alcançar uma vida melhor, onde todos tivessem direito a uma nesga de sol, um espaço de liberdade e uma enorme vontade de cantar, era o mais belo sonho, onde ele próprio queria tomar parte activa. Há um tempo para partir, mesmo com lágrimas nos olhos, mesmo com o coração despedaçado, mesmo olhando para trás e caminhando para a frente, num tempo que não espera por nós. Não podemos ficar à espera, sem saber se a vida tem algo para nos dar, nem que seja apenas uma oportunidade, mas o passo em frente tem que ser dado pelos nossos pés. Pois nada iria cair do céu aos trambolhões. Aventura é coisa que está sempre presente na mente de qualquer jovem, uma longa caminhada apresenta-se como surpreendente descoberta, ou forte necessidade de arrumar ideias. Se nada disto acontecer, mais tarde, haverá um espaço onde nada cresceu: nem um marco foi erguido, nem uma árvore deu frutos, nem os ventos sopraram nela. É como que um vazio se tenha instalado numa fase da vida, sem qualquer registo; uma página em branco num livro denso cheio de vírgulas, interrogações e muitas reticências.” In “Dez Réis de Gente”, de Adriano Pacheco, pag. 48 e 49 Edição da: ADIBER Como se pode ler no Prefácio de João Coelho, “Dez Réis de Gente é um livro de memórias, de afectos e de solidariedade onde as palavras cheiram a povo. Um livro que Adriano Pacheco escreve com imensa paixão pela sua terra e em inteira identidade com as suas raízes, alargadas estas à Beira Serra beirã. Mas não só. Adriano Pacheco viaja no espaço, e até no tempo com as gentes serranas pela diáspora, em especial na diáspora lisboeta. Um livro que evoca pessoas e lugares, ritmos de vida e trabalhos, crenças e valores, trazendo à memória factos de alguma realidade, embora ficcionados pela criatividade do autor, mas com o “saber de experiência feito”, através duma narrativa coloquial, comovente e interligada.” “Dez Réis de Gente”, um livro que merece uma leitura atenta e que poderá encontrar na Biblioteca da União, no Colmeal. A. Domingos Santos

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