São tantos beirões que deixaram as suas
aldeias em busca duma vida melhor, tantos que ainda hoje não sabemos, nem
fazemos ideia, de quantos foram e para onde foram mourejar, na esperança de
erguerem uma vida digna, feita de trabalho, talvez aventura, com sucesso ou
insucesso. Supostamente fazendo tudo aquilo que mais ninguém queria fazer, para
sustentarem a sua família e arranjarem o “pé-de-meia” para acautelarem um
futuro incerto.
Somos tantos os desenraizados que ao longo
dos tempos se foram adaptando aos novos hábitos das regiões de acolhimento, num
propósito de serem assimilados e de vencerem dificuldades que a vida lhes ia
colocando no caminho, sempre com a melhor dos desempenhos e coragem perante
adversidades que iam surgindo. Somos tantos que ainda estatística nenhuma, ou
estudo, falou de nós como se fossemos mais uns tantos nesta terra de ninguém.
Continuamos a ser muitos os que agora habitam
espaços citadinos, ou labutam na lezíria do Ribatejo, quem sabe se na planície
do Alentejo, sentindo-se mais de lá do que de cá. De tal sorte, que sobre esta
diáspora pouco conhecida, fora dos grandes estudos sociológicos que nos diga,
tanto quanto possível, quantos deixaram a sua aldeia serrana, para onde foram,
o que fizeram e o que são hoje nessa terra onde se encontrem. Somos tantos que
mal poderemos fazer uma ideia, para já não falar dos descendentes de segundas e
terceiras gerações. Mas estes, certamente, poderão ser encontrados nas
universidades, nas autarquias, nas grandes empresas e até mesmo no seio dos
governantes. O beirão é assim…
Curiosamente, ou talvez não, nos vários ramos
de negócio e nas velhas profissões populares, típicas duma cidade milenar como
Lisboa, ainda é possível encontrar-se resquícios bem vivos da passagem de
conterrâneos que fizeram vida digna de registo nesta cidade: foram eles
estivadores, bagageiros, marçanos, almeidas, engraxadores, cauteleiros,
taxistas etc. Sobre os quais já se escreveu abundantemente ao longo destes anos
de aprendiz de escriba.
Porém, ainda nos falta falar da mais típica e
popular profissão das ruas da cidade de Lisboa a quem lhe chamavam “moço de
esquina”, ou “moço de fretes”, actividade credenciada pela Câmara desta cidade,
que apenas requeria alguma força muscular, esperteza, matreirice e toda a
disponibilidade para ajudar a resolver problemas surgidos à última hora. Dentro
em breve teremos um trabalho sobre este tema.
O seu proverbial conhecimento sobre as ruas e
becos da cidade e a sua reconhecida figura de boné e corda ao ombro, são
símbolos próprios desta velha profissão que já não existe. Nada, nem ninguém,
sabia mais sobre a sociedade citadina do que este homem dotado de grande
afabilidade e de boa disposição. A sua prosápia era de tal maneira contagiante que
não deixava ninguém indiferente, nem sem resposta.
Estes homens de baixa estatura e de boas
cores, eram todos, ou quase todos, dos concelhos de Góis, Arganil e de
Pampilhosa da Serra, tanto quanto nos é dado conhecer e a vida nos ensinou.
Adriano Pacheco
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