09 agosto 2025

Aqui na Roça, o dia a dia.

Introdução

"Mas porquê?" -  Relata questões que vão surgindo durante as várias etapas da vida. Geralmente a etapa seguinte clarifica dúvidas  da anterior, mas há outras não esclarecidas e  nos acompanham ao longo da vida. É objectivo do autor revelar uma dúvida guardada na memória visual e ainda não esclarecida à data.

Mas porquê?

 

Capítulo 1

 

Naquela manhã de Outubro de 1966, no  bairro da Eira, a manhã era quente e triste. O  ar  carregado de energia,  atrai nuvens negras e ameaçadoras vindas do lado dos Cepos e para surpresa geral, do lado do Carvalhal do Sapo, a situação se repete.

Vamos ter trovoada a sério! Exclama alguém na sua janela. - É verdade Ti Costa, este mês  vai muito quente, tem dado jeito para a secagem do milho e do feijão, mas estou muito preocupada com a situação, porque ainda me falta fazer o recolhimento dos meus lodeiros da Ribeira e ainda não me esqueci do ano passado. A trovoada inundou todo o terreno, salvei o milho, porque o mê Manel  se meteu na água até às vergonhas, apanhando as espigas de milho e mandando para a margem, onde eu as recolhia, para dentro dos sacos todos encharcados. - Até logo!  Vou até ao Coiço do Chão, não vá o rio subir e por lá ficar todo o feijão a grelar. - Vá com Deus, Ti Maria!

A Eira caminhava para a hora de ponta.  Os gritos da pequenada local , ficam abafados em face da imensa algazarra que se aproxima vinda pela estrada do Porto Azinheira. Lá vem os garotos do Soito para a escola. - Só fazem asneiras!  Anda lá um que se o apanho a jeito vai levar um grande puxão de orelhas. -Sabe Ti Maria! Ontem, depois de sair da escola, foi à minha  capoeira e soltou as galinhas. A minha sorte foi a raposa não ter dado com elas e não ter passado por aqui a Guarda. De uma multa não me livrava, ainda na semana passada a Ti Deolinda, foi multada. -Teve sorte Ti Leocádia! - Olhe lá vem a Sra. Professora! -Que acha dela? -Parece ser muito boa pessoa, para a semana a ver se lá mando o mê Tonho com uns ovos. -  Coitada tão novinha e aqui tão isolada. -Um dia irá para uma grande cidade, Ti Leocádia! - Sabe que a profissão de professora é muito importante e reconhecida, assim como ser marido da Sra. professora. Há muitos que a única profissão que tem é ser marido da Sra. Professora, de resto não fazem mais nada. Não fale assim Ti Maria que é pecado.

Surge um relâmpago e de seguida um grande trovão, sinal de que a trovoada estava perto. Começam a cair  de imediato umas gotas grossas e gélidas, dando por findas todas as questões  e previsões entabuladas na via pública. 

Arrumo cuidadosamente as minhas velhas pilhas, meus únicos brinquedos de eleição, na ausência de outros e regresso a casa para pegar na minha ardósia e empreender o caminho para a escola. No caminho a mente atormenta, interroga.  -Mas porquê?   - Quando for grande quero ser marido da Sra. Professora.

Segue no próximo episódio.

Um bom fim de semana para todos.

 

Domingos Nunes

 

Colmeal, 08 de Agosto de 2025.

 

Fotos:


Foto n-º 1 - Via principal da Eira

Foto n-º 2 - Via de acesso à Igreja matriz e cemitério, assim como ao Edifício da União das Freguesias de Cadafaz e Colmeal.

Foto n-º 3 - Edifício da união de freguesias. Este edifício foi construído posteriormente, no local onde funcionava a antiga escola.

 


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