Mas porquê?.
Episódio 2
No dia seguinte, a Eira amanhece clara e silenciosa.
Trovoada nem sinais, mas ficou um frio de rachar, tendo mesmo o autor se negado
a tirar as ovelhas antes de ir para a escola. Mas depois de um escaldão nas
orelhas, lá veio a vontade de cumprir o dever.
Estrada do Porto azinheira abaixo, encontro o Melro (1), a
vender sardinhas à Ti Emília. Vá Ti Emília! Compre uma dúzia e eu dou-lhe uma
para o gato. - Vou ali apanhar umas folhas de couve para as levar. -Venho já!.
-Abra bem a folha! 1,2,13 uma dúzia de 13. -Estão tão amarelas! -Mas são
as melhores que já vendi. Frite envoltas em farinha. -Olhe, como é que
está o tempo lá na Serra? Muito frio Ti Emília! De manhã quando me
levantei tive de vestir umas ceroulas, estamos a caminho do inverno. -Então ó
seu coscuvilheiro, sempre a espiar! -Era para ver o peixe! Não há muito para
ver. Nesta canastra tenho sardinhas e na outra, tenho carapaus. -E também
dá um para o Gato? -Sim! Para o Gato, "mas porquê?". Na minha
ideia o gato só comia ratos e tinha de os apanhar se queria.
Para contentamento dos aldeões a trovoada passou e
felizmente não se verificaram danos de monta. O rio apanhou uma pequena cheia e
a água cristalina, passou a barrenta. O nosso velho pontão de madeira lá
baloiçava na crista da corrente e nos privou dos acessos ao Coiço do Chão,
Cubeta, Fogesta. Atravessar o rio a pé era perigoso, derivado à força da
corrente e havia sempre o perigo de um grande banho forçado e a perda dos sacos
de feijão, que na altura era o forte do Coiço do Chão.
-Ó Ti Maria dos Anjos! -Temos de falar com os homens a ver
se no domingo depois da missa lá vão colocar o pontão no sítio. Estou muito
preocupada. -Porquê Ti Leocádia? -Então não sabe o burburinho que ontem houve
na taberna do Ti Jorge? (2) -Segundo o mê Tonho, as coisas estavam feias.
O Gaspar e o Manel , (da Cruz da Rua), desentenderam-se e nem sabemos bem
porquê. O Gaspar correu atrás do Manel para o apanhar e lhe dar um corretivo,
mas parece que não o apanhou. Andaram a correr um atrás do outro à volta da
capela de S. Nicolau. A sorte do Manel, foi que a mulher abriu a porta de
casa no momento certo e ele nem olhou para trás. Más notícias, Ti Leocádia!.
-Se os homens estão zangados, vai ser difícil levantar o pontão no
domingo.
"Mas porquê"? A correr um atrás do outro à volta
da capela.
Continua no próximo episódio.
Um bom fim de semana para todos.
Domingos Nunes
Colmeal, 15 de Agosto de 2025.
(2) O Ti Jorge. -Residia no lugar do Rossaio e tinha uma
superfície comercial no Colmeal, onde vendia de tudo. Um génio de
comerciante e relações públicas. Aprendi muito com ele e senti muito a sua
falta.
Fotos:
Foto 4 - O pontão na atualidade. Foto 5 - A argola onde se prendia a corrente que segurava o pontão, em caso de cheia.
P.S. As fotos 1 a 3, estão inseridas no primeiro episódio.
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