Fizeram-me chegar há uns tempos –
lembrança que muito apreciei e agradeço –, “O
Grande Livro das Antiguidades” (Rebo Productions, The Netherlands, 2000).
É um livro muito interessante, pelo assunto e pela
extraordinária riqueza e diversidade da informação e das antiguidades que
apresenta, organizadas por categorias que se regem, umas vezes pela
funcionalidade dos objetos, outras pelo material de que são feitos, outras
ainda, pelos estilos em que se inserem. Numa variedade absolutamente
fantástica, as categorias desdobram-se em numerosas subcategorias!
No capítulo das cerâmicas, que me pareceu sem surpresa e por
razões óbvias o mais extenso, consta, entre muitas outras, a porcelana de
Meissen, cidade da então República Democrática Alemã, onde, pela primeira vez,
tive oportunidade de acompanhar, numa fábrica transformada em museu vivo, o
ciclo de produção da loiça, em visita guiada que recordo como exemplo de otimização
de recursos e organização. A queda do muro de Berlim estava para breve. Também
no que toca à loiça de Delft, recordo que a honrei, na ausência da informação
que o livro me proporcionou, com a compra de uma série de tamanquinhas
holandesas em miniatura!
Apesar de se tratar de um livro transversal e transnacional,
que contempla produções provenientes dos mais diversos domínios e distantes
partes do mundo, abrangendo do século XVIII à primeira metade do XX, não
encontrei qualquer referência a marcas e produtos portugueses merecedores de
menção. Entre outros, estou a pensar na loiça da Vista Alegre ou, no extremo
oposto da posição social, nos pratos ratinhos, loiça de Coimbra que os beirões
levavam para as ceifas, no Alentejo, e deixavam por lá, vendidos ou trocados
pela prenda com que regressavam para a mulher amada, mãe, esposa ou namorada. É
pena!
Por força do conceito de antiguidades que lhe subjaz –
“objetos encantadores, desenhados por artistas e com um design bonito e
funcional” (p. 8) – a obra incide
sobre a esfera doméstica e do consumo, deixando de parte a esfera do trabalho e
da produção e os utensílios, digamos que menos diferenciados. Confirma-se,
assim, como digo no livro “Dos Objectos
para as Pessoas” (2007), que “nem sempre aos objetos mais humildes é dada a
mesma visibilidade que às «jóias da coroa» ou às produções dos grandes autores” (p. 9).
No plano temporal, considera-se antiguidade um objeto com uns
escassos cinquenta anos, conceção muito pouco atual, face à velocidade a que a
mudança e o desuso se processam hoje em dia. De qualquer modo, vem dar razão à
minha amiga que foi até ao eletrão com um ferro de passar e um computador, e
depois voltou com eles para casa, precisamente por ter pensado que o novo de
hoje será o antigo de amanhã!
De acordo com o livro, colecionar antiguidades é um
investimento, e pode ser muito enriquecedor, permitindo o estudo da história,
das técnicas, dos estilos e das artes (p. 9-10). Não menciona as dimensões do
respeito pelo labor dos artífices e de símbolo e memória de afetos, que
presidem às preocupações de preservação de muitos de nós, cidadãos, autarquias
ou associações. Preocupações essas que se traduzem na reutilização dos objetos,
com a mesma ou função distinta da que tinham originariamente, e na sua inclusão
em museus e centros de interpretação.
Trata-se de realidades e abordagens distintas? Sem dúvida!
Precisamente por isso é que são tão enriquecedoras, interessantes e
complementares, justificando que continuemos a construir o nosso próprio espólio
de memória e identidade, “a evocar histórias de vida, afetos, aromas e sabores,
espaços e tempos sociais. E a sugerir o futuro, no devir ininterrupto do tempo
e das gerações” (Dos Objectos para as
Pessoas, p. 10). Também a contribuir para a sustentabilidade da economia
local, como recurso ao serviço da investigação e do turismo cultural e de
lazer.
Que eu saiba, temos os museus ou núcleos museológicos de
Fajão e do Piódão, do Colmeal (Miniaturas do Artur) e da Cabreira, do Açor e do
Cortarredor, do Soito, da Aigra Nova e da Pena, mas outros poderão surgir, no
pressuposto de que os objetos devem permanecer no espaço físico e simbólico a
que pertencem e de que os museus devem funcionar em rede.
O livro pertence à biblioteca da União Progressiva da Freguesia
do Colmeal. Consulte-o e não se arrependerá.
Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 5 de Maio de 2013
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