O
Museu Etnográfico Dr. Louzã Henriques situado na linda vila da Lousã alberga um
espólio riquíssimo merecedor de ser apreciado com muita atenção. Por isso a
União Progressiva da Freguesia do Colmeal entendeu introduzir no programa que
preparou para o regresso dos Comandos à Serra do Açor e ao Colmeal uma visita a
este espaço.
Na
exposição permanente iremos ter oportunidade de admirar os carros e as cangas,
os arados, as pás e as enxadas, a cerâmica/olaria, e nos núcleos situados no piso
2 podemos ficar a conhecer como se faz o pão, se prepara o linho/lã, a arte de
ferreiro, os segredos da apicultura e recordar como era uma cozinha serrana com
os seus diversos utensílios.
“Os primeiros carros que
apareceram foram só de um animal, isto é, com varal duplo. Dizem que era mais
simples pela aptidão da tal forquilha que há nas árvores, ter um par de animais
e liga-los por uma trave.”
“Quando há uma certa
riqueza, as pessoas têm de dar aos seus carros, aos seus bois, às suas cangas,
o prestígio da sua casa. Elas ficam também com o brasão e então fazem-se cangas
de luxo. Cangas para levar às festas, para levar a feiras e que são o prestígio
da casa…”
“À génese do arado
atribuem-se várias hipóteses: desde uma pequena enxada que depois é puxada por
um temão, às vezes tiradoira, onde se aplica a força de animais ou o
aproveitamento natural de alguns pedaços de árvores que tinham fundamentalmente
três peças – uma capaz de rasgar a terra, outra de ser ligada aos animais, e
outra que lhe desse direcção, que era a rabiça. Três peças: rabiça, temão e
dente…”
“… está aqui uma
razoável amostragem das pás (célebres) de valador. Eram trabalhos difíceis.
Normalmente eram homens da região da Bairrada, que iam fazer este trabalho por
toda a Zona do Ribatejo e até ao Alentejo. Um pouco antes das culturas, depois
das chuvas, eles iam fazer o escoamento para começarem as operações agrícolas
de lavragem.”
“… a nossa região
tinha rebanhos, tinha carneiros e, naturalmente, tinha uma coisa que já se
perdeu e eram os linhares, terras de linhos. …As formas de tecelagem vão desde
as peças mais ou menos finas do linho - que ainda todos conheceram e têm encontrado
nas arcas das avós –as mantas, colchas, tapetes, e outras, com uma decoração
mais ou menos simples, mais ou menos requintada…”
“… este sistema de
eira, de malhar, estão ali os trigos, estão ali os mangais, estão aqui os tipos
fundamentais. E está aqui assim uma coisa muito rara, que é a colecção completa
das cirandas ou crivos… os sistemas de moagem… as mós…”
“… quando o homem
descobre a possibilidade de ter uma qualquer forma de caixa na qual ponha as
abelhas, já que não as pode domesticar, (…) vai servir-se dos materiais de cada
região. Para nós é o cortiço, de muito fácil transporte. Nós, na Serra da
Lousã, o que é que temos disto? Um bocadinho da mitologia do mel! Uma coisa
cheia de virtudes mágicas! Um bom alimento, grosso, e escuro porque predomina
fundamentalmente a urze…”
“E é curioso que o
latoeiro não só dava apoio à panela em que punha o pingo, para além de fazer o
que lhe mandavam de novo, como assistia os pratos e as colheres de lata, uma vez
que só os garfos eram, de facto, feitos pelo ferreiro. Além disso, é ainda ele
que cuida da loiça: é o grande consertador dos pratos partidos, que conserta
pondo gatos… Esta arte está em extinção, como está a do velho ferreiro…”
“… há uma coisa muito
interessante que é uma modificação deste comer simples e do povo e que é
engraçado que os Lousanenses não esqueceram – “os aferventados”. Que é uma
ligeira modificação desta velha técnica de comer e modificar o sabor das
couves, do pão, da batatita, do que têm próximo, do que tem à mão e
naturalmente regado com azeite, a velha gordura mediterrânica de que até esta
região é rica.”
Estamos
certos de que os nossos Comandos e os seus acompanhantes se irão deliciar com
todos estes utensílios, que já fazem de um passado não muito distante e que os
nossos pais e avós muito bem conheciam.
Fotografias
de A. Domingos Santos
Apoio
Folheto do Museu
1 comentário:
Para quem se interesse pelos modos de vida tradicionais rurais e pelos saberes e tecnologias que lhes estavam associados, vale de facto a pena visitar este museu. Devido ao espólio que apresenta, mas também pela própria apresentação, que em muito contribui para valorizar o património imaterial para que as peças remetem.
A propósito e por ter a ver, para mais proximamente sentir o homem e o social que estão por trás dos objetos, e lhes dão vida, poderá ler-se o livro de Paulo Monteiro “Terra que já foi Terra” (Edições Salamandra, 1985). É a edição de uma dissertação de mestrado em sociologia, cujo estudo decorreu em nove lugares, alguns já então desabitados, da serra da Lousã. Um desses lugares era o Candal, hoje "Aldeia do Xisto". O autor partiu da análise de um molho de cartas que alguém encontrou numa casa em ruínas, molho de cartas esse que, curiosamente, incorporava as cartas que em inícios do século XX uma mulher enviava ao marido emigrado, penso que no Canadá, e as que ele lhe enviava a ela.
Lisete de Matos
Açor, Colmeal
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