Teve de ser. Ontem fui ao Colmeal. E, já que estava lá e não se avistavam outras pessoas, decidi fazer a minha caminhada do dia, descendo até ao rio. Pois não é que tive a surpresa de me encontrar, ao mesmo tempo, a celebrar o Natal e a primavera? Sinal dos tempos, talvez, mas bem gratificante!
O Natal, de que este ano muitos se privaram em benefício dos outros, está consubstanciado no presépio que permanece no recinto da igreja. Sem ser o presépio deslumbrante que fazia as delícias da minha infância, é um exemplar muito sóbrio e encantador, formado pelas figuras principais dispostas em dois grupos: um primeiro com o Menino Jesus, os pais e os animais que o ajudaram a aquecer; um segundo com os reis magos e uns cordeirinhos. Muito significativo, acrescenta simbologia ao símbolo que é. Em primeiro lugar, por se encontrar graciosamente abrigado entre os potes do azeite e do mel, desse modo sugerindo a oferta ao Menino desses produtos do nosso labor, em substituição do ouro, do incenso e da mirra com que os reis magos O presentearam. Depois, por continuar ali, no exterior, tanto tempo, frio e sofrimento passados, quando nós temos o dever de ficar no interior, em casa.
Como sabemos, o presépio é uma representação do nascimento de Jesus Cristo, tradição que remonta a S. Francisco de Assis, nos finais do século XIII. Quando ainda é instalado, uma vez que tem vindo a perder terreno para outros valores e simbologias, é costume manter-se durante a quadra natalícia, que vai até 6 de janeiro, dia em que os reis magos terão chegado a Belém, guiados pela estrela que os iluminava.
No pressuposto de que a permanência do presépio é uma consequência da crise sanitária e social que vivemos, não consegui deixar de pensar: será que os reis magos se atrasaram, eles próprios ou a estrela também confinados e impedidos de circular? Será que se pretende devolver-nos o Natal, eliminando o sofrimento e as perdas humanas que se lhe seguiram? Seja como for, o facto é que o presépio persiste, a celebrar, para os crentes, o nascimento do Salvador e a convocar o renascimento de que carecemos, quando a páscoa ressurreição já está próxima. E a tornar a família presente, não obstante o distanciamento físico que lhe devemos.
A primavera é a primavera. Entre outras manifestações, podia ver-se e sentir-se: no sobreiro gigantesco e vetusto que resiste, protetor; nas árvores de fruto que começam a vicejar e a desabrochar promissoras; nas florinhas silvestres que brotam por toda a parte tímidas e humildes; no Ceira que corre sereno e livre, a caminho do Mondego e do oceano … A serpentear vales recônditos e a vencer, corajoso, obstáculos impensáveis!
Ao subir do rio, desciam uma senhora e uma menina, mas a alameda Fernando Costa permitiu que nos cruzássemos em segurança. A propósito, há mais arruamentos que foram calcetados, mostrando-se muito cuidados.
Votos de muita saúde para todos.
Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 6 de março de 2021
7 comentários:
Dra. Lisete, muito grata por ler as suas palavras e por ver as fotos da nossa aldeia.
Um bem haja.
Beijinhos
Catarina
gostei muito do texto e as fotografias são lindíssimas. Obrigada
Texto tão simples. "Natal é quando o homem quiser". Um ditado antigo, sempre actual. Natal e Primavera. Uma conjugação bem necessária.
Obrigado.
Dr.ª. Lisete
Não tenho palavras para exprimir a sua sensibilidade e a beleza das fotos que sempre nos oferece e que tanto nos deliciam. Também gostei imenso do texto.
Parabéns e muito obrigada mais uma vez.
Beijinhos
Lisete, é tão bom "regressar" ao Colmeal através das suas palavras e das suas fotografias! Obrigado!
Rui Ferreira
Simpatia de todos! Dos olhos, do coração, da saudade ... Bem hajam. Tudo de bom.
Abraço.
Lisete de Matos
As imagens que partilha connosco e os textos que as emolduram, Dra. Lisete, não sei se me acalmam ou se me aumentam a saudade desses "caminhos velhos"... bem-haja!
Deonilde Almeida
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