22 abril 2018

RENOVAÇÃO



Continua a chover intensamente. Nas atuais circunstâncias, uma chuva que é uma bênção e uma maldição. Bênção porque adoça com a humidade necessária ao despertar das sementes e raízes adormecidas, maldição porque teima em desnudar a serra, reduzindo vastas áreas a fragas e calhaus pouco propícios ao enraizamento da vegetação.

Mas é de renovação que venho falar! Já acontecia em janeiro, quando dizia que a natureza se ia recompondo, com o poder regenerador e a generosidade de que os homens ainda a não privaram. Persiste em abril, tempo de retoma e vitória da luz sobre as trevas, chegando a ser comovente a determinação com que algumas plantas renascem das cinzas, aparentemente mais airosas e fortalecidas.

Nos terrenos de semeadura, as herbáceas estão de volta, muito especialmente as gramíneas. Pujantes e avassaladoras, ameaçam a sobrevivência das restantes e o equilíbrio ecológico geral. Imbatíveis, arrancam-se ou ceifam-se para os animais e voltam crescer. Depois de cortadas, inteiras ou moídas, formarão sobre a terra um manto denso e paradoxal de semente e material combustível. As manchas vermelhas são de erva-moleirinha, mas há de tudo um pouco, a revestir de verde matizado o solo escurecido.



Tal como nos caminhos e orlas da floresta, onde são visíveis, tímida ou confiadamente a despontar, silvas atrevidas, saramago erudito, cebola-albarrã espanta toupeiras, abrótea e cilas discretas, cantarinhas e campainhas delicadas… Entre muitas outras, claro!










Neste processo, que desejaríamos ainda mais célere e abrangente, seguem-se os matos e arbustos, que começam a rebentar fogosos, sobretudo nas soalheiras. Um encanto aqueles viços tenros e ternos a brotarem, acotovelando-se, das torgas ardidas ou do cascalho solto! É o caso das carquejas, sargaços, urzes, ervideiros (medronheiros), lentiscas… Para os caminhantes de 5 de maio próximo, fica a observação do que estará a passar-se com o azereiro, o folhado e a aderneira, espécies da flora ancestral que abundavam no percurso.













Possivelmente devido ao porte, as árvores são as mais atrasadas. Tão atrasadas que a maioria não chegará. As poucas oliveiras que deram sinais de vida apresentam rebentos tão frágeis que poderão perder-se, na floresta, apenas os eucaliptos vão vestindo o verde-acinzentado que os carateriza.





Parece mesmo – real e metaforicamente falando - que a terra queimada pode dar o melhor cereal. Não é por acaso que se semeiam alfobres nas borralheiras ou que os pastores fazem queimadas controladas. Reportando-me a um contributo de há dias, agradeço a mensagem de fé e esperança.

Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 9 de abril de 2018


1 comentário:

Anónimo disse...

Obrigado pela partilha, dra. Lisete. É sempre com muito agrado que leio os seus artigos. Até dia 5!
Rui Ferreira