Continua
a chover intensamente. Nas atuais circunstâncias, uma chuva que é uma bênção e
uma maldição. Bênção porque adoça com a humidade necessária ao despertar das
sementes e raízes adormecidas, maldição porque teima em desnudar a serra, reduzindo
vastas áreas a fragas e calhaus pouco propícios ao enraizamento da vegetação.
Mas é de renovação que venho
falar! Já acontecia em janeiro, quando dizia que a natureza se ia recompondo, com
o poder regenerador e a generosidade de que os homens ainda a não privaram. Persiste
em abril, tempo de retoma e vitória da luz sobre as trevas, chegando a ser comovente
a determinação com que algumas plantas renascem das cinzas, aparentemente mais airosas
e fortalecidas.
Nos terrenos de semeadura, as
herbáceas estão de volta, muito especialmente as gramíneas. Pujantes e avassaladoras,
ameaçam a sobrevivência das restantes e o equilíbrio ecológico geral. Imbatíveis,
arrancam-se ou ceifam-se para os animais e voltam crescer. Depois de cortadas,
inteiras ou moídas, formarão sobre a terra um manto denso e paradoxal de semente
e material combustível. As manchas vermelhas são de erva-moleirinha, mas há de
tudo um pouco, a revestir de verde matizado o solo escurecido.
Tal como nos caminhos e orlas
da floresta, onde são visíveis, tímida ou confiadamente a despontar, silvas
atrevidas, saramago erudito, cebola-albarrã espanta toupeiras, abrótea e cilas discretas,
cantarinhas e campainhas delicadas… Entre muitas outras, claro!
Neste processo, que
desejaríamos ainda mais célere e abrangente, seguem-se os matos e arbustos, que
começam a rebentar fogosos, sobretudo nas soalheiras. Um encanto aqueles viços
tenros e ternos a brotarem, acotovelando-se, das torgas ardidas ou do cascalho
solto! É o caso das carquejas, sargaços, urzes, ervideiros (medronheiros), lentiscas…
Para os caminhantes de 5 de maio próximo, fica a observação do que estará a passar-se
com o azereiro, o folhado e a aderneira, espécies da flora ancestral que
abundavam no percurso.
Possivelmente devido ao
porte, as árvores são as mais atrasadas. Tão atrasadas que a maioria não
chegará. As poucas oliveiras que deram sinais de vida apresentam rebentos tão frágeis
que poderão perder-se, na floresta, apenas os eucaliptos vão vestindo o
verde-acinzentado que os carateriza.
Parece mesmo – real e
metaforicamente falando - que a terra queimada pode dar o melhor cereal. Não é
por acaso que se semeiam alfobres nas borralheiras ou que os pastores fazem queimadas
controladas. Reportando-me a um contributo de há dias, agradeço a mensagem de
fé e esperança.
Lisete de Matos
Açor, Colmeal, 9 de abril de
2018
1 comentário:
Obrigado pela partilha, dra. Lisete. É sempre com muito agrado que leio os seus artigos. Até dia 5!
Rui Ferreira
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